Uma
história de Dom Quixote
Moacyr Scliar
Quando se fala num quixote, as pessoas logo
pensam num desastrado, num sujeito que não consegue fazer nada direito, que tem
boas ideias, mas sempre quebra a cara. E até repetem aquela história que o
escritor espanhol Cervantes contou sobre o Dom Quixote.
Ele era um daqueles cavaleiros andantes que usavam
armadura, lança e escudo; percorria as planícies da Espanha num cavalo muito
magro e muito feio, chamado Rocinante, procurando inimigos a quem pudesse
desafiar em nome da moça que amava, e que ele chamava de Dulcineia. Pois um dia
este Quixote avistou ao longe uns moinhos de vento.
Naquela
época, vocês sabem, o trigo era moído desta maneira: havia um enorme cata-vento
que fazia girar a máquina de moer. Pois o Dom Quixote viu, nesses moinhos,
gigantes que agitavam os braços, desafiando-os para a luta.
Sancho
Pança, seu ajudante, tentou convencê-lo de que não havia gigante nenhum; mas
foi inútil.
Dom Quixote estava certo de que aquele era o
grande combate de sua vida. Empunhando a
lança, partiu a galope contra os gigantes…
O
resultado, diz Cervantes, foi desastroso. A lança do cavaleiro ficou presa nas
asas do moinho, ele foi levantado no ar e depois jogado para longe. Para
Sancho, e para todas as pessoas que ali viviam, uma clara prova de que o homem
era mesmo maluco.
Essa era a história que Cervantes contava. Já
meu tatara-tatara-tataravô, que também conheceu o Dom Quixote, narrava o
episódio de uma maneira inteiramente diferente. Ele dizia que, de fato, Dom
Quixote viu os moinhos e que ficou fascinado com eles, mas não por confundi-los
com gigantes. “Se eu conseguir enfiar minha lança naquelas asas que giram”,
pensou, “e se puder aguentar firme, terei descoberto uma coisa sensacional.”
E foi o que ele tentou. Não deu completamente
certo, porque nada do que a gente faz dá completamente certo; mas, no momento
em que a asa do moinho levantava o Dom Quixote, ele viveu o seu momento de
glória. Estava subindo, como os astronautas hoje sobem; estava avistando uma
paisagem maravilhosa, os campos cultivados, as casas, talvez o mar, lá longe,
talvez as terras de além-mar, com as quais todo o mundo sonhava. Mais que isso,
ele tinha descoberto uma maneira sensacional de se divertir.
É verdade que levou um tombo, um tombo feio.
Mas isso, naquele momento, não tinha importância. Não para Dom Quixote, o
inventor da roda-gigante.
Extraído e
adaptado de FILHO, Otavio Frias et al. Vice-versa ao contrário:histórias
clássicas recontadas. São Paulo: Companhia das Letrinhas, 1993
Questão
01
O autor, Moacyr
Scliar, reconta a clássica história de Dom Quixote alterando a versão original.
O artifício que utiliza para atingir esse objetivo é
( A ) introduzir, no texto, a versão de seu
tatara-tatara-tataravô, um contador de histórias.
( B ) desmentir a história contada por Cervantes, autor
do texto original.
( C ) confrontar as versões do seu tatara-tatara-tataravô
e a de Cervantes, já que ambos conheceram pessoalmente Dom Quixote.
( D ) ambientar a história em um parque de diversões a
fim de torná-la mais leve e divertida.
( E ) recontar a história de acordo com sua imaginação,
desconsiderando totalmente a versão original.
Questão
02
Considere as
afirmações que seguem a respeito do texto lido.
l. Em suas aventuras, Dom Quixote era acompanhado por seu
cavalo Rocinante, por sua amada Dulcineia e por seu fiel escudeiro Sancho
Pança.
II. Sancho Pança
tinha maior senso de realidade do que Dom Quixote, mas não conseguia fazê-lo
desistir de suas ideias.
III. Embora normalmente Dom Quixote se desse
mal em suas aventuras, na versão contada por Moacyr Scliar, o personagem atinge
seu momento de glória ao inventar a roda gigante. Quais estão corretas?
( A) I, II e III. ( B) Apenas II. ( C )
II e III. ( D) Apenas III. ( E)
Apenas I.
Questão
03
Se o narrador da história
fosse o próprio Dom Quixote, a frase “Dom Quixote estava certo de que aquele
era o grande combate de sua vida.” poderia ser reescrita, mantendo-se a
coerência, como:
( A ) Eu estava certa de que
estava diante do grande combate de minha vida.
( B ) Eu estava certo de que
aquele era o grande combate de minha vida.
( C ) Eu estava certo de que
aquele era o grande combate de nossa vida.
( D ) Nós estávamos certos
de que se tratava do grande combate de nossa vida.
( E ) Nós estávamos certos
de que aquele era o grande combate de minha vida.
Questão
04
Em um texto narrativo, a história se
desenvolve sobretudo com base em uma complicação e em um clímax. As ações que
sintetizam essas partes, respectivamente, são
( A ) o momento em que Dom
Quixote leva um tombo feio – o momento em que ele inventa a roda gigante.
( B ) o momento em que Dom
Quixote empunha sua lança e combate os moinhos – o momento em que ele vê os
gigantes e fica fascinado.
( C ) o momento em que Dom
Quixote percorre as planícies da Espanha procurando inimigos para desafiar – o
momento em que ele se apaixona por Dulcineia.
( D ) o momento em que
Sancho Pança tenta inutilmente convencer Dom Quixote de que não havia gigante
nenhum – o momento em que Dom Quixote é levantado pelo moinho e vive seu
momento de glória.
( E ) o momento em que Dom
Quixote desafia para a luta os moinhos de vento - o momento em que ele enfia
sua lança nas “asas” dos moinhos.
Questão
05
Em narrativas de ficção, o
narrador pode mencionar fatos ou expressar opiniões sobre a história.
Considerando essa afirmação, analise os trechos selecionados, assinalando se
indicam FATO (F) ou OPINIÃO (O). Depois, escolha a alternativa que corresponda
a sua resposta.
( ) “Ele
era um daqueles cavaleiros andantes que usavam armadura, lança e escudo, […].”
( )
“Naquela época, vocês sabem, o trigo era moído desta maneira: havia um enorme
cata-vento que fazia girar a máquina de moer.”
( ) “O
resultado, diz Cervantes, foi desastroso.”
( ) “Para
Sancho, e para todas as pessoas que ali viviam, uma clara prova de que o homem
era mesmo maluco.”
( ) “Não
deu completamente certo, porque nada do que a gente faz dá completamente certo;
[…].”
( A ) F – F – O – O – F
( B ) F – F – O – O – O
( C ) O – F – F – O – O
( D ) O – O – F – F – O
( E ) F – O – O – F – F
Questão
06
Observe o período:
“A lança do cavaleiro ficou presa nas asas do
moinho, ele foi levantado no ar e depois jogado para longe.” Se as ações acima
descritas, situadas no passado, indicassem hipótese, o trecho deveria ser
reescrito da seguinte maneira:
( A ) A lança do cavaleiro
ficara presa nas asas do moinho; ele fora levantado no ar e depois jogado para
longe.
( B ) Se a lança do
cavaleiro ficasse presa nas asas do moinho, ele seria levantado no ar e depois
jogado para longe.
( C ) A lança do cavaleiro
havia ficado presa nas asas do moinho, ele havia sido levantado no ar e depois
jogado para longe.
( D ) Quando a lança do
cavaleiro ficar presa nas asas do moinho, ele será levantado no ar e depois
será jogado para longe.
( E ) Caso a lança do cavaleiro fique presa
nas asas do moinho, ele deve ser levantado no ar e depois jogado para longe.
Questão
07
Em “Pois um dia este Dom
Quixote avistou ao longe uns moinhos de vento.”
O uso da palavra pois pode ser explicado como
( A ) uma conjunção
explicativa que vincula a ideia iniciada no período à frase anterior.
( B ) um termo que objetiva
dar continuidade à narrativa, tornando a linguagem mais rebuscada.
( C ) uma marca de oralidade
reproduzida na escrita.
( D ) uma conjunção
conclusiva que mantém o mesmo sentido de então.
( E ) um recurso específico
das narrativas, que imprime mais dinamicidade à história contada.
Questão
08
Em “(…) as pessoas logo
pensam num sujeito que não consegue fazer nada direito, que tem boas ideias,
mas sempre quebra a cara.”, a expressão destacada é usada informalmente. Para
se adequar à norma culta, mantendo-se o sentido pretendido, a expressão poderia
ser substituída por
( A ) se frustra.
( B ) se dá mal.
( C ) se coloca em confusão.
( D ) é mal sucedido em suas
ações.
( E ) é mal compreendido.
Questão
09
Em “Mais que isso, ele tinha
descoberto uma maneira sensacional de se divertir.”, o termo destacado só não
poderia ser substituído, sem prejuízo de sentido, por
( A ) maravilhosa. ( B )
inesquecível. ( C ) fantástica. ( D ) espetacular. ( E ) extraordinária.
Colégio Militar ,Porto Alegre
GABARITO
1 A / 2 C / 3 B /
4 E / 5 B / 6 B / 7 C / 8 D / 9 B
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