ASA CURTA
Asa Curta era um
passarinho já muito velho, mas que ainda não sabia voar. Ele tinha aprendido,
em seus oito anos de vida, muita coisa que passarinho nenhum desse mundo nunca
haveria de saber.
Quem já viu
passarinho nadar? – e esse nadava; quem já viu passarinho ler um livro? – e
esse lia; quem já viu passarinho dançar? – e esse dançava tudo que é dança que
gente sabe dançar: samba que nem o brasileiro, tango que nem o argentino, polca
como os russos, valsa como os austríacos, baião e xaxado que nem os
nordestinos, rock, tuíste, iê-iê-iê e essas danças todas que os americanos já
inventaram. Até mesmo algumas que ninguém nunca dançou, que ele mesmo tinha
inventado e até batizado: o saracoteio, o vira-e-mexe, o passodo-passarinho, a
dança-do-bico-pro-ar...
E havia ainda muita coisa mais que o Asa Curta
fazia, diferente de tudo quanto os outros passarinhos sabiam fazer. Ele era
mesmo um artista, desses de ganhar prêmio em programa de televisão: dava cambalhota
como gente de circo, levantava galho de árvore com uma pata só, imitava voz de
homem e voz de mulher, assoviava comendo alpiste...
Mas de que adiantava fazer tudo isso – e muito mais, que
ele só não fazia porque senão os outros iam pensar que ele era um passarinho
louco – , de que adiantava tudo isso, se ele não sabia fazer o que o mais novo
e o mais analfabeto passarinho de qualquer floresta ou de qualquer cidade era
capaz de fazer? De que adiantava ser o passarinho mais famoso que já houve na terra
dos passarinhos, se ele não sabia voar?
– Não adianta
nada! – queixava-se o velho Asa Curta, em conversas com Andorinha Veloz, sua
maior amiga e a única criatura que conhecia esse seu segredo de não saber voar.
– Mas você é o passarinho mais perfeito que todo o mundo já viu, Asa Curta!
Sabe fazer casa como o João de Barro, canta que nem um Curió. E, depois, é
artista de dar inveja a toda a gente.
É, a Andorinha Veloz tinha razão: ele podia
fazer tudo isso, mas não se sentia nem um pouco feliz porque não era capaz de
voar. E por isso ele tinha poucos amigos: como ia ter coragem de dizer para
eles que não sabia voar? Por isso ele nunca tinha pensado em se casar: depois,
como ia fazer para ensinar seus filhotes a voar, e para arranjar comida pra
eles e pra sua mulher? (...)
Mas tristeza
mesmo ele tinha era quando seus amigos chegavam de viagem. Um dia era o Pardal
Ambulante, que tinha visitado a Argentina e corria logo pra contar ao Asa
Curta:
– Mas é
impressionante, companheiro, como que o povo lá dança tango igualzinho você
sabe dançar.
No outro dia, era
o Pica-Pau Leva-e-Traz, que tinha ido até a Rússia vender pau-brasil e comprar
madeira russa para os pica-paus brasileiros.
– Nossa, Asa
Curta, eu vi o pessoal dançando na rua uns troços do mesmo jeito que você dança
aqui.
Era a polca, que
Asa Curta tinha aprendido a dançar lendo uns livros russos. Ele morria de
vontade de ver como é que cada povo dançava a sua dança, mas não podia chegar a
lugar nenhum só andando. E então, quando os outros passarinhos lhe perguntavam
por que ele não viajava também, Asa Curta saía sempre com desculpas:
QUESTÃO
01.
Após leitura atenta do texto, é CORRETO afirmar que Asa
Curta
A ( ) vive um
dilema muito grande por ser diferente, mas não deixa de fazer absolutamente
nada do que os outros pássaros fazem.
B ( ) acostumou-se
com sua diferença, não vendo mais necessidade de ser igual ou parecido com os
outros pássaros.
C ( ) dedica-se a
levar uma vida plena de realizações, embora deseje, também, realizar os feitos
que sua diferença o impedem de fazer.
D ( ) acostumou-se
a ser diferente e, mesmo não podendo fazer tudo, sente-se realizado e feliz.
E ( ) vive um
dilema grande, uma vez que sua diferença o isolou do convívio com os demais
pássaros.
QUESTÃO
02.
Observe o trecho: “ – Mas você é o passarinho mais
perfeito que todo o mundo já viu, Asa Curta! Sabe fazer casa como o João de Barro, canta que nem um Curió.”
A palavra em destaque, de acordo com os padrões normativos da gramática,
deveria ser grafada com letra minúscula e hífen. No entanto, ao escrevê-la
utilizando letra maiúscula, infere-se que o objetivo do autor do texto é
A ( ) destacar uma
ideia caracterizadora do ser.
B ( ) generalizar
o ser, colocando-o como um ser que possui vivência singular e autônoma.
C ( )
particularizar o ser, ou seja, um nome comum passa a ser individualizado. D ( ) particularizar o ser, mostrando-o sob um
aspecto comum.
E ( ) reforçar o aspecto genérico do ser, já que o
vocábulo, na forma em que foi escrito, estende seu significado aos demais seres
da espécie.
QUESTÃO
03.
Quanto à conduta de Asa Curta, conclui-se que ele é um
pássaro
A ( ) vivaz, sem
conflitos e que não se importa com a opinião alheia.
B ( ) autêntico,
feliz e plenamente realizado.
C ( ) confiante,
alegre e, apesar de suas limitações, satisfeito com a vida.
D ( ) ativo, inteligente e preocupado com a
opinião dos outros em relação a suas atitudes.
E ( ) criativo,
autêntico e acomodado em sua realidade.
QUESTÃO
04.
A palavra “queixava-se” não poderia ser substituída, no contexto, por
A ( )
orgulhava-se.
B ( )
lamentava-se.
C ( )
desgostava-se.
D ( )
lastimava-se.
E ( )
lamuriava-se.
QUESTÃO 05.
A única opção em que a troca do vocábulo destacado pela
palavra que está entre parênteses altera completamente o sentido dos trechos é
A ( ) “...imitava voz de homem e de mulher...”
(reproduzia).
B ( ) “... os
outros iam pensar que ele era um
passarinho louco...” (imaginar).
C ( ) “...ele já
estava cansado desse conhecimento só
de livros.” (enjoado).
D ( ) “Ou, então,
era obrigado a dizer uma mentira qualquer”
(forçado)
E ( ) “... como ia ter coragem de dizer para eles
que não sabia voar?” (porque).
QUESTÃO
06
Com base na leitura do texto, a proposição INCORRETA é
que
A ( ) “mas” introduz
uma ideia de oposição.
B ( ) o termo
“tudo isso” se refere ao fato de Asa Curta poder voar.
C ( ) a palavra
“quando” expressa a mesma circunstância da expressão “um dia”.
D ( ) a palavra
“se” estabelece, no contexto, uma idéia de condição.
E ( ) o vocábulo
“amiga” refere-se a Andorinha Veloz.
Gabarito
1C/ 2C/ 3D/ 4A/ 5E/ 6B
Nenhum comentário:
Postar um comentário