O homem e seu cachorro
Eis uma história que
me contaram há muito tempo. Se é mentira, fica por conta de quem me contou,
porque não conheci o homem nem o seu cachorro. Mas gosto da história que me
contaram, muito humana e muito pura. É verdade que narrada assim, numa prosa sem
colorido, perde toda a sua pureza e toda a sua humanidade.
Havia um homem que
possuía um cachorro. Coisa, aliás, muito simples. Porque o destino dos
cachorros é esse mesmo de se tornarem propriedade dos homens.
Mas neste caso a
coisa era diferente. Aquele homem não tinha mulher, não tinha filhos, não tinha
amigos. Vivia só com seu cachorro. Se era um cão de raça. Sabido como aqueles
que figuram nas páginas das revistas populares americanas, eu não sei. Mas sei
que era o companheiro inseparável daquele solitário. Aliás, ele passou a ser
chamado o homem do cachorro, tanto se confundiam os destinos das duas
criaturas.
Um dia, o homem olhou
para o céu e viu que não haveria chuva. Esperou com pouca esperança e muita
resignação. Até que a seca se declarou.
Quando já não podia
viver na terra natal, arrumou os trastes, amarrou o cachorro e se fez no
caminho para a grande jornada.
Nesse tempo, o trem
chegava até Quixadá. E o homem atravessou o sertão, sempre com o seu cachorro. Viu
muita tristeza, as criancinhas morrendo de fome, velhas esqueléticas, corpos
descompostos atirados aos urubus.
E não esmoreceu,
andava sempre. Tinha um vago pressentimento de que chegaria a algum lugar. Não atinava
bem para onde ia. Aliás, o caso bem pensado, ele não ia mesmo não. Apenas saía.
Saía da sua casa, onde sempre vivera solitário.
Poderia ter ficado,
esperando a morte pacientemente, e talvez não morresse. Vivia só, só não, porque
tinha o seu cachorro.
Afinal fugira e agora
penava por aquelas estradas desertas. Muita fome ia sentindo. Não havia dinheiro,
não havia água, não havia alimento.
Uma noite sentiu que
as pernas lhe fraquejavam. Caiu à beira do rio seco. Dormiu um bom tempo. E sonhou.
O que o homem sonhou nunca me contaram, mas me disseram que quando ele abriu os
olhos o cachorro estava deitado pacientemente a seu lado, velando aquele sono
agoniado e faminto.
Foi assim que o homem
chegou a Quixadá. Não tinha dinheiro para a passagem. Procurou então a comissão
de socorro. Deram-lhe um pouco pra comer, cigarros para fumar e a passagem para
embarcar no dia seguinte.
Era bem cedinho
quando chegou à estação. Acomodou-se na calçada com o companheiro a seus pés. Na
hora da partida, o chefe da estação mandou que ele parasse, e ele parou. Não podia
tomar o trem. Só se fosse sem o cão.
O homem olhou o papel
da passagem. Olhou para o chefe da estação. Olhou o trem. E olhou a estrada
também. Aí segurou com muita força a corda do seu cachorro e saiu andando por
cima dos trilhos.
João Clímaco Bezerra
Atividades
1- Logo no início da crônica, o autor faz uma advertência
sobre:
( ) a simplicidade da história.
( ) a veracidade da história. X
( ) a beleza da história.
( ) a importância da história.
2- Segundo as palavras do autor, a história, depois de
narrada por ele:
( ) perde completamente a sua pureza e a sua
humanidade. X
( ) ficou
cheia de pureza e humanidade.
( ) não poderia tocar os corações puros e
humanos.
( ) poderia perder toada sua pureza e
humanidade.
3- No segundo parágrafo, o autor diz que “o destino dos
cachorros ´é esse mesmo de se tornarem propriedade dos homens”. Qual das
alternativas abaixo traduz melhor a expressão usada pelo autor?
( ) Por causa da
fidelidade, o cão sempre é acolhido pelo homem.
( ) Por não poder
sobreviver sozinho, o cão acaba sendo acolhido pelo homem. X
( ) Todo cão
sempre busca a companhia do homem.
( ) Todo cão recebe proteção do homem por causa
de sua fidelidade.
4- Através do texto você pode sentir quem era o homem,
personagem da crônica de João Clímaco Bezerra. Para ele, o cão representava a
figura de um :
( ) amigo. X
( ) acompanhante.
( ) companheiro.
( ) animal.
5- Agora, você vai caracterizar a personagem. Ela é uma
figura que nos impressiona principalmente porque se apresenta:
( ) conformista e persistente.
( ) esperançosa e
inquieta. X
( ) desesperançosa
e abatida.
( ) intranquila e nervosa.
6- Ao chegar a Quixadá, a personagem procurou a comissão de
socorro a fim de que, através dela:
( ) conseguisse matar a fome.
( ) conseguisse trabalho em Quixadá.
( ) conseguisse dinheiro.
( ) pudesse
seguir viagem. X
7- No final da crônica, a atitude que a personagem assume, e
que nos fez admirá-la ainda mais, é de:
( ) renúncia, decisão
e gratidão. X
( ) insistência,
decisão e gratidão.
( ) renúncia, indecisão e agradecimento.
( ) paciência,
indecisão e gratidão.
8- Produção de texto. Na história não sabemos o que
aconteceu com o homem e o seu cachorro, após saírem andando por cima dos
trilhos. O que você acha que pode ter acontecido com os dois? Use a sua
imaginação e invente um final para a crônica de João Clímaco Bezerra.
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ResponderExcluirGente, não entendo porque é uma crônica e não um conto....
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